Carga tributária e a perpetuação das desigualdades de gênero

Carga tributária e desigualdade de gênero

Neste Dia Internacional da Mulher, nosso escritório faz uma reflexão crítica sobre um tema crucial: carga tributária e desigualdade de gênero no Brasil.

Historicamente, a carga tributária brasileira não tem sido neutra em termos de gênero, ampliando ainda mais a desigualdade salarial e o tratamento discrepante entre mulheres e homens em diversas esferas.

O sistema tributário atual, focado na tributação sobre o consumo, reforça tal desigualdade e tendência de taxação maior sobre produtos essenciais de higiene pessoal feminina, prática conhecida popularmente como “taxa rosa” ou, no inglês, “pink tax”.

Esse fenômeno reflete não apenas uma questão de desigualdade econômica, mas também de dignidade

Os absorventes menstruais, essenciais a qualquer pessoa do sexo feminino, estão sujeitos, no Brasil, a uma alíquota de aproximadamente 27,5%. Outros  produtos femininos são exemplos de altas taxações, como os anticoncepcionais (30%), DIU hormonal (30%) e DIU de cobre (32,45%), enquanto produtos masculinos possuem uma tributação muito menor, como os preservativos masculinos (9,25%) e o Viagra (18%). Sem contar que os preservativos masculinos, além de serem distribuídos gratuitamente, contam com isenções de diversos impostos como IPI e ICMS em alguns estados, e o Viagra é isento de IPI, PIS e COFINS.

A tributação sobre o consumo afeta de forma mais nefasta as mulheres de baixa renda

Recentemente, o debate sobre a pobreza menstrual ganhou visibilidade na mídia, destacando a dificuldade financeira que as mulheres enfrentam para arcar com os altos custos dos absorventes menstruais. Isso levou ao Congresso Nacional a derrubar  veto anterior, viabilizando a distribuição de absorventes no Sistema Único de Saúde (SUS).

Outra mudança significativa foi a decisão do Supremo Tribunal Federal, em junho de 2022, que afastou a incidência de Imposto de Renda (IR) sobre valores recebidos como pensões alimentícias. Durante o julgamento, observou-se que, na maioria dos casos, a guarda dos filhos é concedida às mães. Tributar esses valores agravava a desigualdade de gênero, pois as mulheres além de cuidar dos filhos, precisavam lidar com o ônus tributário da pensão alimentícia, enquanto os pais podiam deduzir integralmente esses valores no IR.

Mas ainda há muito a ser feito. É essencial que a Reforma Tributária (Emenda Constitucional nº 132), aprovada no final de 2023, leve em consideração as desigualdades de gênero, mediante à adoção de medidas como alíquotas diferenciadas e isenções fiscais para produtos essenciais femininos, bem como a consideração de políticas fiscais que compensem as desigualdades socioeconômicas enfrentadas pelas mulheres.

Em resumo, o debate sobre a incorporação da perspectiva de gênero na Reforma Tributária é fundamental e oferece uma oportunidade única para o Brasil avançar em direção a um sistema tributário mais justo e equitativo. Organizações de defesa dos direitos das mulheres e especialistas em tributação e gênero têm destacado a necessidade de um sistema tributário que reconheça e mitigue tais desigualdades de gênero. Este não é apenas um desafio técnico de política tributária, mas também um imperativo ético e social que exige reconhecimento e ação.

Neste Dia Internacional da Mulher, reafirmamos nosso compromisso com a promoção da igualdade de gênero, incluindo uma análise crítica e comprometida com a equidade de gênero nas políticas tributárias, visando construir uma sociedade mais justa e igualitária.

Por Ana Paula Becegato e Gabriella Barone.