A Lei nº 14.193/2021 instituiu a Sociedade Anônima do Futebol (SAF), uma nova modalidade empresarial voltada para a prática profissional do futebol feminino e masculino, com o objetivo de estabelecer diretrizes de governança, controle e fontes de financiamento específicas para a atividade futebolística. Atualmente, mais de 25 sociedades já foram constituídas nesse formato no Brasil, destacando-se clubes renomados como Cruzeiro, Vasco, Botafogo, Bahia e Cuiabá. além de vários outros (que possuem natureza de associação civil) e outras sociedades empresariais dedicadas ao fomento e à prática do futebol que já estão em fase de estudos para aderir a essa modalidade empresarial.
A SAF pode ser constituída de três maneiras distintas: (i) a primeira é a criação direta, onde a SAF é estabelecida como uma nova entidade desde o início; (II) a segunda é a transformação, em que um clube ou uma sociedade empresarial dedicada ao fomento e à prática do futebol já existente se converte em SAF, resultando em uma reformulação completa da natureza jurídica da entidade; e (iii) a terceira é a cisão, em que o clube realiza uma transformação parcial, convertendo apenas o departamento de futebol em SAF, sendo que nesse último caso, um acordo é necessário para definir a utilização das estruturas relacionadas ao futebol e a exploração da propriedade intelectual do clube.
Com o objetivo de proteger a identidade e os interesses do clube fundador, são estabelecidas as ações de Classe A, as quais representam, em geral, 10% do total de ações da SAF e são emitidas de forma exclusiva pelo próprio clube fundador, conferindo-lhe maior controle e influência sobre decisões importantes, como alienação de bens, reorganizações societárias, dissolução da entidade, participação em competições oficiais, mudança de sede, nome e símbolos do clube.
A governança corporativa desempenha um papel essencial na SAF, visando garantir transparência e o bom funcionamento da entidade. Para promover uma gestão eficiente, medidas são adotadas como a obrigatoriedade de instalação e funcionamento permanente do Conselho de Administração e do Conselho Fiscal, a realização de publicações eletrônicas obrigatórias e a divulgação de informações institucionais e sobre a estrutura de governança corporativa no site da SAF.
Conflito de interesse: algumas restrições são obrigatórias para acionistas e administradores da SAF
(i) o acionista controlador não pode possuir ações de outra SAF;
(ii) acionistas com mais de 10% de participação em uma SAF perdem o direito de voto, se possuírem participação em outra SAF;
(iii) acionistas com mais de 5% de participação devem compartilhar suas informações com a Confederação Brasileira de Futebol (CBF); e
(iv) os administradores da SAF estão proibidos de ocupar cargos em outros conselhos ou diretorias de SAFs, do clube fundador, de órgãos organizadores de campeonatos de futebol ou, ainda, atuar como árbitros de futebol.
Tais medidas visam assegurar a transparência e a integridade na gestão da entidade, além de evitarem os conflitos de interesse.
No que diz respeito aos passivos do clube fundador, existem regras específicas a serem seguidas: os passivos anteriores à constituição da SAF são de responsabilidade exclusiva do clube fundador, e a SAF é obrigada a repassar 20% de suas receitas correntes mensais para garantir o pagamento desses passivos. A lei ainda inova, estabelecendo um novo modelo de pagamento de passivos, o chamado Regime Centralizado de Execuções, no qual o pagamento dos credores é centralizado em um único juízo, seguindo uma ordem de prioridades.
Neste modelo, o clube fundador tem um prazo de dez anos para quitar suas dívidas, com uma meta de pagamento de 60% nos primeiros seis anos. Enquanto a SAF efetuar os repasses ao clube fundador para permitir o cumprimento de seus compromissos perante os credores, os ativos e receitas da SAF não podem ser penhorados ou afetados por ordens de bloqueio de qualquer natureza em processos judiciais iniciados por credores do clube fundador por obrigações anteriores à constituição da SAF.
Além disso, a criação da SAF oferece novas alternativas financeiras para lidar com as dívidas, como a negociação de deságio, a cessão do crédito a terceiros, a conversão da dívida em ações da SAF e a emissão de títulos de mercado para pagamento da dívida, conhecidos como “debêntures-fut”. Essas alternativas permitem o financiamento de forma mais vantajosa, de acordo com as condições de mercado.
O regime tributário da SAF
Do ponto de vista tributário, a SAF está sujeita ao Regime de Tributação Específica do Futebol (TEF), que unifica o pagamento dos seguintes impostos: IRPJ, CSLL, PIS/PASEP, COFINS e INSS. Nos primeiros cinco anos de constituição, a alíquota é de 5% sobre a receita bruta mensal, excluindo a receita com transferências de jogadores.
A partir do sexto ano, a alíquota passa para 4%, incidindo sobre todas as receitas, incluindo as transferências de jogadores. Esse regime tributário oferece vantagens como baixo custo de conformidade, alíquota reduzida nos primeiros anos e previsibilidade do ônus tributário de acordo com a receita auferida.
Portanto, a implementação da Sociedade Anônima de Futebol além de ser uma alternativa de reestruturação para os clubes fundadores, representa ainda um passo significativo na busca por uma gestão mais eficiente e estratégica, capaz de elevar o patamar do futebol nacional e consolidar seu papel como um dos pilares do desenvolvimento esportivo e econômico do Brasil.
É importante destacar que a adoção da SAF não é uma solução milagrosa para todos os problemas enfrentados pelos clubes de futebol. Cada caso deve ser analisado individualmente, levando em consideração as características específicas do clube e as particularidades do mercado em que está inserido.
Nossa equipe de profissionais especializados está pronta para auxiliar na compreensão dos aspectos legais envolvidos, fornecendo orientações claras e estratégicas para uma implementação bem-sucedida da SAF.